Habitats do Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia
Aleksandro Zaslawski


As orquídeas ocorrem em uma grande variedade de habitats encontrados desde o nível do mar até montanhas elevadas, com temperaturas elevadas, mais amenas ou mais frias. É isto o que atrai as pessoas para o cultivo dessas maravilhosas plantas. Cada planta é um desafio. É necessário muita paciência, observação e estudo para se chegar ao meio ideal de cultivar cada uma. O aprendizado coma as orquídeas chega a ser um aprendizado de vida tal a mudança que esta planta nos provoca, pois temos que nos adaptar a ela e não elas a nós. As orquídeas vivem em perfeito equilíbrio com a natureza. Elas geralmente são endêmicas de uma determinada área e qualquer desequilíbrio neste habitat pode levar à extinção da planta que ali habita.

Serão mostrados vários habitats de orquídeas nos estados do Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia. Começaremos pelas Restingas do Espírito Santo, uma área intocada até 5 ou 6 anos atrás, mas, infelizmente, foi descoberta por “orquidófilos” que a estão depredando pela coleta desenfreada, chegando a sair muitas vezes caminhões carregados de orquídeas. As mudas de orquídeas indesejadas são abandonadas ao sol para morrer ou para serem comidas pelo gado.
A restinga do Espírito Santo tem cerca de 300m de largura e acompanha todo o litoral do Estado. É uma área rica em Cattleya guttata, vários epidendrum, principalmente o epidendrum denticulatum, Brassavola e Vanilla. Os seedlings de guttata crescem sobre o emaranhado da vegetação e as raízes seguem em direção da areia onde captam a umidade ali existente. Existe uma gama enorme de coloração de guttatas nessa área. Em nossas andanças pela área, eu e meu pai, Wladyslaw, nunca observamos guttatas pelóricas (trilabelo), apesar de, como já disse, haver uma grande variedade cromática. Em compensação já vi várias Cattleyas leopolii pelóricas.
A Cattleya guttata é a espécie representativa da restinga do Espírito Santo. Existem as guttatas de restingas e as de árvore. A Cattleya guttata de restinga floresce no final de fevereiro, já as de árvore florescem 2 meses depois. Existe um híbrido natural entre a Cattleya guttata e a Brassavola que é a Brassocattleya fregona que foi batizada em homenagem a Jayr Fregona. Infelizmente este híbrido foi coletado impiedosamente até a completa extinção.
Existe uma movimentação de algumas pessoas no sentido de tombar a restinga, mas é um processo difícil, pois estão dentro dos limites de fundos de fazenda e os fazendeiros geralmente são ou foram prefeitos das cidades onde ocorre a restinga e, portanto influentes o bastante para impedir o tombamento. Não bastassem os mateiros ainda existe o gado solto para pastar que devoram as orquídeas. O problema mais recente foi a descoberta de petróleo na área. Em outras áreas do Espírito Santo, a vegetação foi dizimada para dar lugar a pasto e atualmente para o plantio de eucalipto pela industria de papel.
Estamos fazendo híbridos de Cattleya guttata com Brassavola tuberculata e conseguimos 2 variedades e estamos fazendo sementeira, mas, algumas vezes, as sementes não são férteis. Os seedlings são semeados em brita pura e adubados unicamente com torta de mamona com bons resultados.
Vamos conversar agora sobre as rupículas do Estado do Espírito Santo. A Laelia gloedeniana, nomeada em homenagem a Heitor Gloeden, é encontrada apenas em um morro perto de Marataízes onde, antigamente, era abundante. Agora se encontra ameaçada sendo encontrada apenas em escarpas de difícil acesso. É uma planta de porte alto que cresce em uma camada de turfa depositada sobre a superfície da pedra. Fizemos uma semeadura e obtivemos plantas com flores amarelas.
A Laelia macrobulbosa ocorre na região em volta de Domingo Martins em altitude em torno de 1200 m. É uma planta de porte mais baixo com bulbos mais grossos, que cresce sobre as velosias. É uma planta relativamente desconhecida e ainda não despertou a cobiça dos mateiros. A área onde ela ocorre foi transformada em reserva e então elas estão protegidas.
No Pico do Forno Grande, com 2.000 m de altitude podemos encontrar a Laelia cowani que é a rupícola de maior porte, com bulbos que alcançam até 60 cm de comprimento. Nesta região também existem áreas de grande umidade onde podem ser encontrados o Oncidium enderianum, Sophronitis coccinea e a Cattleya schofieldiana. Esta área sofre grandes quedas de temperatura à noite. Oncidium enderianum são encontradas no meio das ilhas de vegetação que crescem sobre a rocha , onde ficam bem camuflados. Se não estiverem floridos é quase impossível encontrá-los. Em pedras com grande quantidade de musgo podemos encontrar Sophronitis coccinea crescendo associadas a ele. A 2.400m, de altitude, podemos encontrara enormes touceiras de Maxillaria picta crescendo junto com Amarílis. Na floresta úmida encontramos em abundância, Oncidium forbesii e Bifrenaria tyrianthina com uma grande variedade de cores.

Em um morro próximo ao rio Doce, que corta o estado Espírito Santo ao meio, Michel Frei descobriu Pseudolaelia maquijiensis. Esta pseudolaelia só é encontrada atualmente em paredões em lugares de difícil acesso e muito perigoso.

Mudando agora para Colatina quero dizer que esta cidade e seus arredores, atualmente, é um local muito quente, mas, no passado, foi um local de clima fresco e agradável que o desmatamento destruiu. Nesta área, ainda é possível encontrar Zygopetalum e Pseudolaelia dutrae, bem como Cyrtopodium e Laelia colnagoi (1) que apresenta flores amareladas e foi descrita em homenagem a Euclídio Colnagoi.. Esta é uma área rochosa muito íngrime e a Pseudolaelia brejetibensis é encontrada nas cores alba e rosada.

Passaremos para a Serra da Caraça (que significa cara grande), em Minas Gerais. Aqui o ponto mais alto tem 2.068 m de altitude. Nesta área, podemos encontrar a maior número de variedades de Laelias, como a Laelia jongheana encontrada em diversas áreas do parque, a 1.000 m de altitude, Laelia kettieana, Laelia lucasiana (*) nas cores rosa ou albina com labelo amarelo crescendo junto ao líquen. Também encontramos Laelia flava (*) em abundância.
A Serra do Espinhaço e a do Cipó apresentam uma vegetação muito interessante, muito seca, com muitas plantas endêmicas. A Laelia ghillanyi é encontrada a 1.500 m de altitude e aparece com a folhagem em diferentes tonalidades, porém se trata da mesma planta. Possui flores com grande variedade de cores inclusive flameada. Também encontramos a Laelia crispata (*) que é amplamente distribuída e também a Pseudolaelia cipoensis crescendo sobre as pedras. Também encontrada a Laelia ghillanyi que ocorre nas depressões das rochas. Esta espécie possui flores de coloração muito escura e, em alguns casos, são flameadas.

Próximo a Diamantina, podemos encontrar Laelia briegeri vegetando em locais rochosos de formação granítica ou quartzo, com flores amarelas e pétalas largas e com boa forma.

Descendo de Diamantina para o Vale do Jequitinhonha vamos encontrar a Laelia angereri com facilidade apenas em época de floração. Fora desta época a planta passa despercebida. Recentemente foi descoberta a 1.400m Laelia kleberii que é uma planta de médio porte cujo bulbo atinge no máximo 30 cm. Apresenta flores muito bonitas com grande variação de cores, indo do creme ao magenta, passando pelo amarelo e o laranja forte. No pico Itambé, encontramos a Laelia itambana e, por ser uma área de mineração, esta espécie é ameaçada de extinção.

Ao norte de Diamantina, a 1.300 m de altitude encontramos a Laelia mirandae (2) que foi descrita em homenagem a Francisco Miranda, Esta espécie vegeta em áreas extremamente secas junto aos cactos. Também encontramos a Laelia crispata (*). Felizmente poucas pessoas gostam destas plantas e por isso ainda não desapareceram. Em nosso orquidário, cultivamos as laelias em casca de pinus e brita, sendo que a Laelia crispata não vai bem dentro do orquidário. Foi encontrado nesta área a Laelia x britoi (3) que é um híbrido natural entre Laelia mirandoi e Laelia crispata (*).

A Chapada Diamantina fica a 400 km de Salvador e as principais cidades são Lençóis, Mucugê e Ibicuara. Esta área possui aeroporto e boa infra-estrutura hoteleira. É uma formação em meseta e só se chega ao topo das mesetas através de fendas e a subida deve ser feita com o auxílio de guias pela dificuldade de reencontrar as fendas para a descida. Encontramos a Laelia sincorana em cima e a Cattleya elongata em baixo crescendo sobre arenito que é areia compactada. A Cattleya elongata necessita de água ferruginosa e é uma planta de difícil cultivo.. A população local é paupérrima e para sobreviver queima a vegetação. Quando a vegetação queimada começa a brotar, o mocó sai da toca para comer os brotos e então é caçado para servir de refeição para as famílias. Essas queimadas obviamente também queimam as orquídeas. Podemos encontrar também a Encyclia alboxantina que é muito perfumada. Suas raízes se espalham pela rocha e sua sobrevivência só é garantida graças à queda de temperatura à noite e ao orvalho que se deposita sobre tudo. A sobrevivência é difícil e, freqüentemente, vemos planta com a maior parte dos bulbos traseiros secos.

Finalmente, podemos encontrar também Laelia bahiensis perto do cemitério de Mucugé, Laelia pfisteri que cresce no barro no meio da vegetação, Sobralia liliastrum e Epistephium apresentando hastes com até 1,80 m de altura.


Notas da Diretoria técnica
(*) As espécies abaixo assinaladas sofreram alterações nomenclaturais pelo estudioso Francisco Miranda
Laelia lucasiana = Laelia longipes
Laelia flava =Laelia crispata
Laelia crispata = Laelia rupestris

(1) Laelia colnagoi - descrita por Chiron & V. P. Castro como Hoffmannseggella colnagoi
(2) Laelia mirandoi - descrita por K.G. Lacerda & V. P. Castro Hoffmannseggella mirandae
(3) Laelia x britoi - descrita por K.G. Lacerda & V.P. Castro como Hoffmannseggella x britoi (híbrido de Hoffmannseggella mirandae x Hoffmannseggela rupestris)